Sempre que leio uma notícia destas consigo visualizar o futuro próximo do Brasil. A Irlanda era pobre, pensou que era rica, viveu a euforia imobiliária e agora volta à sua realidade.
Estouro da bolha imobiliária cria problemas sociais
O país que viveu a farra dos imóveis hoje convive com obras abandonadas, habitantes sem casa e construtoras ameaçadas
14 de novembro de 2010 | 0h 00
- O Estado de S.Paulo
Ruas inteiras desertas, bairros fantasma, apartamentos e casas abandonadas e milhares de trabalhadores desempregados. Esse é o resultado da bolha imobiliária na Irlanda, uma das principais responsáveis pela atual recessão. Estimativas do governo apontam que 300 mil casas estejam vazias hoje no país; 100 mil irlandeses ainda renegociam suas dívidas
Há dez anos, a perspectiva de crescimento da economia, a chegada de investidores estrangeiros e o aumento da renda alimentaram um boom sem precedentes no setor imobiliário no país. Fazendeiros chegaram a deixar de plantar, de coletar os subsídios da UE e vender suas terras para empreendedores por verdadeiras fortunas.
Hoje, não há sequer um quarteirão onde não se vê placas de vende-se e anúncios de leilão de casas tomadas por bancos de seus proprietários, diante da incapacidade de pagamento.
Na sexta-feira, a Irlanda viveu mais uma bomba. A empresa McNamara, uma das maiores construtoras do país, foi colocada sob administração de terceiros. Com dívidas de 1,5 milhão, a companhia deixou de honrar suas dívidas com empreitaras e parou de pagar salários. Há dois dias, canteiros de obras da empresa foram tomadas por trabalhadores em protesto.
Mas tanto o mercado como o governo sabem que a liquidação da construtora é uma questão de dias. A quebra ainda corre o risco de gerar mais um efeito dominó, já que dezenas de companhias que prestavam serviços para a McNamara também não terão a quem vender.
Tanto na capital Dublin como no interior, centenas de casas e canteiros de obras foram abandonados sem terminar. Mas especialistas alertam que é a destituição de casas que está gerando o impacto social mais profundo. "Havia o grupo de especuladores. Mas também havia famílias que depositaram toda sua poupança na compra de casas. Agora, não tem casa nem poupança", afirmou Joan Burton, porta-voz de finanças do Partido Trabalhista Irlandês. "Todas as regulações falharam. Ainda houve uma triangulação tóxica entre governo, bancos e empreiteras."
No campo, fazendeiros começam a reagir contra a atitude dos bancos. Na semana passada, um banco colocou à leilão uma fazenda na região de Cork. O dono, de 67 anos, havia colocado seu imóvel como garantia para um empreendimento. O negócio faliu e o banco confiscou a terra. Mas, para o leilão, os fazendeiros da região se organizaram e deram apenas 1 euro em ofertas ao banco. "Temos de ser solidários", afirmou John Shannon, um dos vizinhos da fazenda confiscada. "Hoje é ele. Amanhã, poderá ser comigo", disse. "Nenhum fazendeiro aceitará essa atitude."
Em Dublin, a explosão da bolha é visual. O Clarence Hotel, criado pelo líder do U2, Bono, é hoje um fracasso. Desde 2006 não tem lucros. Em 2009, teve prejuízo de 1,6 milhão. Dados oficiais indicam que, desde 2007, os preços de imóveis caíram 48%. Nem assim as vendas se recuperaram. O Estado visitou um quarteirão de casas recém construídas no bairro de Leitrim. Há três anos, o preço de cada uma era de 900 mil. Hoje, valem menos da metade. No local, seguranças admitem que há dias ninguém visita o empreendimento. O problema é que, pela noite, vândalos dão os primeiros sinais de que a bolha imobiliária tem seu lado social. A construtora alerta que não sabe até quando terá dinheiro para pagar por seguranças para proteger casas que ninguém quer comprar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário